MEMÓRIAS DA NOSSA HISTÓRIA
Conventinho de Taubaté. Os Dehonianos no Vale do Paraíba
9.6. Curso de Doutrina Social da Igreja
Por fim, o Instituto Teológico SCJ de Taubaté teve a honra de sediar o primeiro curso de Doutrina Social da Igreja, promovido pela Comissão de Justiça e Paz da BM, do dia 6 ao dia 24 de janeiro de 1997. O curso esteve aberto para padres, religiosos/as e fiéis leigos.
CAPÍTULO 10
A VIDA QUOTIDIANA DO CONVENTINHO
10.1. Conventinho e seus funcionários
10.1.1. O que é o Conventinho
Este nome vem sendo pronunciado quase desde os primórdios da vinda dos dehonianos à “Chácara dos Padres”. A origem dessa denominação deve-se ao fato da residência dos nossos primeiros padres e fratres ser muito modesta em comparação com o “Conventão” (Santa Clara, dos Capuchinhos).
Será que esse nome carinhoso estava ligado ao velho “sobrado dos padres” (construído em 1924), ou ao antigo conjunto de construções da residência de quantos aqui fizeram seus estudos teológicos em tempos idos? Mas tudo isso não existe mais. Tudo foi demolido. E mais, por incrível que pareça, a demolição foi feita pelos próprios estudantes. Até chegou a ser objeto de um poema: “Adeus, Quartel General” (QG)! Sendo assim, temos que procurar uma outra explicação.
É possível, então, que o Conventinho sejam os fratres. Que honra! Sem dúvida, faltando eles, esta imensa casa, que da antiga casa (o velho Conventinho) só herdou o nome, fica triste, silenciosamente triste. Mesmo assim, há um pormenor: o grupo de fratres se renova continuamente. Estes que hoje aqui estão, em breve não estarão mais. Os quatro anos de teologia passam depressa! No entanto, o Conventinho continua existindo.
A mesma consideração poderia ser feita em relação aos professores, os funcionários ou antigos colaboradores. Eles também passam. O Conventinho é anterior aos supramencionados. Pois ele já existia…
Mas, afinal, quem é que faz o Conventinho? Sem dúvida, todos, e mais: a própria casa, o ar que aqui se respira, o nascer e o pôr-do-sol, o trem que passa e nem é mais notado, as espatódeas e as flamboiaiãs que encantam os olhos com suas flores vermelhas, os jardins, o bosque – todos e tudo formam o CONVENTINHO. Conventinho não são só os prédios. Há algo mais profundo que a materialidade que configura o nome de Conventinho. Este carrega em seu bojo uma vida, uma história que transcende os tempos e as pessoas que aqui passaram. Em tudo isso há uma dimensão espiritual. Ele é também formado pelo imenso desejo de servir à Igreja, de ser fiel ao Magistério – o legado maior daqueles que jazem no cemitério de nossa chácara; pelo espírito de alegria que deixa nos que partem uma imensa saudade do tempo de teologia, e particularmente forma o CONVENTINHO a presença d’Aquele que prometeu estar onde dois ou mais se reunissem em seu nome. Enquanto e na medida em que esta presença for cultivada, o CONVENTINHO existirá. E não apenas aqui: estará um pouco em todos aqueles que, tendo vivido à sombra de suas mangueiras, estão hoje em algum lugar desse imenso Brasil, servindo à Igreja e aos homens.
O que é o CONVENTINHO? É um pouco de cada um de nós, padres, fratres, religiosos irmãos, funcionários, funcionárias, amigos, principalmente os que vêm somar… {o autor se inspirou no artigo de padre Murilo S. Krieger na revista O CONVENTINHO (jun. 1979), p. 2}.
10.1.2. Nossos funcionários
Entre diversos componentes que ajudaram a construir o ambiente simpático do Conventinho está a presença dos funcionários e das funcionárias em nossa casa. A presença e a alegria dessas pessoas foram muito importantes para criar o convívio da família dehoniana.
Cremos que não há exagero em afirmar que a história do Conventinho é formada pelos relevantes serviços prestados por pessoas amigas. Os primeiros cozinheiros não religiosos eram homens. Infelizmente, não temos os nomes de todas essas pessoas que dedicaram uma parte de sua vida a serviço da nossa casa religiosa. Entre os cozinheiros, fazemos menção ao sr. Benedito Pereira Moura que trabalhou durante 12 anos (de 1931 a 1943).
Entre as primeiras funcionárias do Conventinho se destaca dona Valdevina (+31.5.1977), mãe do padre José Fernandes de Oliveira. Ela dedicou uns vinte anos (de 1948-1969) de vida ao Convento. Por muitos anos foi costureira, confeccionando “guarda-pós” e consertando batinas. Foi a primeira cozinheira da comunidade. Prestou também serviços na lavanderia, com Aparecida Mendes.
O nosso convento não seria Conventinho se não fosse a comida gostosa, forte, boa, deliciosa e engordante, feita pela Anézia dos Santos S. R. Viana (1967-1987), Maria Ferreira da Silva, Maria Isabel Cursino e a Maria Terezinha Viana (a Cota). “Fazemos a comida com amor, para os padres e estudantes”, diziam elas. É claro que a confirmação dessa verdade não ficou sem resposta por parte dos consumidores.
O Conventinho fez-se, também, pela presença e dedicação de dona Zenaide, dona Bernardina e Maria Isabel dos Santos que, por longos anos lavaram e passaram a roupa dos padres e dos fratres, proporcionando-nos a sensação de estarmos em casa.
O Conventinho não seria bem Conventinho se não fosse o Geninho (Eugênio F. de Medeiros) cuidando da horta, levando a verdura para a cozinha. E o Cupiara (Geraldo Vasconcelos)? Ele cuidava dos jardins, punha-se à disposição do padre Murilo, para viagens curtas e longas. Defendia o passado glorioso do Esporte Clube Taubaté.
Seria uma grande injustiça não mencionar o nome do Zé Maria (José Maria de Camargo), cuidando do refeitório, da copa, da portaria, do telefone. Seria impossível imaginar o Zé Maria sem as suas máximas proverbiais para cada instante e assunto.
Para o remate final dessa sessão em homenagem aos nossos funcionários, temos o “seu Izaltino”, cuidando do bananal, zelando pelas ferramentas para toda espécie de serviços, contando seus “causos”, narrando o passado deste querido Conventinho. Quem é Izaltino? Que tal, uma pequena biografia?!
Quem for procurar sua biografia na Enciclopédia Britânica, certamente nada encontrará. Mas se perguntar a qualquer dos cristãos que no Conventinho estudaram nestes últimos 52 anos, (a maioria se ordenou padre) ficará conhecendo a vida de um senhor de 87 anos de idade. Este senhor, com 52 anos de residência na chácara do Conventinho é uma renovada advertência aos que assumem a reitoria: “é, passam os reitores e eu vou ficando…”. Em tempos idos, esse anacoreta era tão discreto que só era notado quando varria o pátio ou no fim do dia, quando se dirigia à igreja matriz do Sagrado Coração de Jesus, de chapéu, bengala e óculos escuros… Não atrapalhava ninguém. Era capaz de ficar semanas entocado em seu quarto e que, por outro lado, tinha disposição de falar um dia inteiro sem parar. Não existe outro. Mas afinal, quem é este cavalheiro?
Izaltino Hermes da Costa nasceu a 1º de março de 1910, em Rio Preto (MG), no sítio Macuco. É o 4º de 10 irmãos, órfão de pai e mãe desde os dez anos de idade.
Parece que a vida do jovem Izaltino em sua terra natal não foi um mar de rosas. Com 15 anos, em companhia de seus primos, veio para São Paulo, no município de São Luís do Paraitinga. Aí começou a trabalhar em diversas fazendas, onde foi sucessivamente vaqueiro, tropeiro, empregado, lenhador e pequeno “comerciante”. Diz ele, que chegou a participar da Revolução de 1932.
Por motivos de saúde, emigrou para Taubaté. Por algum tempo trabalhou no Hospital Santa Isabel. Segundo ele, foi aí enfermeiro e cuidava do almoxarifado. Trabalhou também no Convento de Santa Clara como sacristão. Não se acertou nessa função. Passou a cuidar das vacas neste mesmo Convento. Os freis se desfizeram das vacas. Foi então, que a convite do nosso irmão José Modesti, ele veio para o Conventinho, no dia 5 de fevereiro de 1945.
Aqui no Convento cuidou do pomar e do bananal. Enfim, foi quase um “factótum” em matéria de chácaras.
O sr. Izaltino nunca trabalhou por lucro. Seu interesse era de fazer algo pelo nosso Convento. Na sua antiga e ingênua concepção de ecônomo, acreditava que a produção do bananal sustentava todo o Conventinho.
O seu quarto podia quase competir com algumas lojas de ferramentas. Quando alguém precisava de um parafuso para sua bicicleta, era só ir ao quarto do sr. Izaltino. Se precisasse de um pedaço de arame para consertar o terço, o sr. Izaltino tinha o máximo prazer de atender o monge orante. E não só isto. Quando um reverendo frater tinha vontade de estar bem informado sobre os resultados dos times de futebol, era só ir conversar com o sr. Izaltino, logo o rádio portátil estava à disposição para empréstimo. Num canto do quarto do nosso cidadão havia foice, enxada e um sempre afinado violão; outro, uma pintura moderna. Dentro do armário e das gavetas era possível encontrar tudo quanto é espécie de pequenas ferramentas para uso caseiro.
Para ele, na sua simplicidade de ser humano, não havia problemas ou dificuldades. Tinha respostas para tudo. Esta afirmação o caracteriza bem: “Papai sabe tudo, conhece tudo”. Até agora, continua cozinhando a sua comida e lavando suas roupas.
Falamos, portanto, do sr. Izaltino. Homem pobre, honesto e piedoso. Reza muito! Sem ser religioso por profissão evangélica, leva uma vida mais desprendida e recolhida que a de muitos religiosos. Suas desventuras de ordem financeira não o fizeram perder a fé nos tesouros divinos. Do seu jeito de entender a religião, fala muito e se confessa devoto da Santíssima Trindade e Maria Santíssima. Espera participar das alegrias do Céu.
Associemos à constelação dos nomes que iluminaram este pedaço de céu, aqueles que ainda hoje servem a nossa casa, como o Zé Nosso , José de Jesus (o Zé de Jesus), Maria Nair dos Santos, Maria Isabel dos Santos, Vilma Vieira Silva, Etelvina Ferreira da Silva, Irene Correa Leite, Maria das Graças de Campos e Terezinha Alves (a Teca). Queremos, na gratidão, incluir todas as pessoas que trabalharam conosco, em qualquer tempo e qualquer atividade.
Pe. José Francisco Schmitt, scj