Palavra de Padre Dehon
Abrimos a nova sessão “Palavra de Padre Dehon” com textos extraídos de sua obra O Coração Sacerdotal de Jesus. P. José Schmitt, com a comunidade do Noviciado Coração de Jesus, verteu ao português brasileiro a tradução feita do original pela Província Portuguesa. Permitimo-nos, no entanto, ulteriores adequações para tornar o texto mais fluente e compreensível. Agradecemos aos confrades e noviços de Barretos por este benefício disponibilizado (Redação de E&L).
A primeira origem do sacerdócio é o seio do Pai (1)
“Parece-nos que é até às alturas sublimes e a estes segredos adoráveis, que devemos elevar os nossos espíritos e os nossos corações, com humildade e amor, no início deste livro sobre o Sacerdócio de Jesus Cristo” (P. Silvano Giraud, Prêtre et Hostie).
O Verbo é a glória do Pai. Dando glória e amor ao seu Pai, não exerce Ele, perante o Pai, uma espécie de sacerdócio? Pode-se dizer que o Verbo é como o sacerdote eterno do Pai na vida íntima e imanente da Santa Trindade. É o tipo eminente de sacerdócio.
1. O Verbo é como o Sacerdote eterno do Pai
O Filho é a glória eterna do Pai: “Splendor gloriae et figura substantiae eius” (Hb 1,3). Mas ser esta glória, amar este estado, nele se comprazer e produzir o ato do amor que responde a esta complacência com aquele que é o princípio deste estado, não é isto exercer uma espécie de sacerdócio a seu respeito? O sacerdote não é outra coisa senão o ministro da glória de Deus, segundo o texto de São Paulo: “Todo sumo sacerdote… é constituído… nas coisas concernentes a Deus” (Hb 5,1). É verdade que esta palavra do Apóstolo foi feita a respeito do sacerdócio tal como ele existe desde a queda, sacerdócio de mediação e de expiação que implica, naquele que dele é revestido, uma verdadeira e necessária inferioridade relativamente àquele que dele recebe a homenagem (Nota: No tempo de Padre Dehon, a Carta aos Hebreus era atribuída ao grande “Apóstolo das Gentes”, São Paulo. Hoje, pela análise literária, sabemos que a linguagem e o estilo deste escrito são de uma pureza elegante, que não pertence a São Paulo. A maneira de citar e usar o AT não é a paulina. Faltam aí o endereço e o preâmbulo, com os quais Paulo costuma iniciar suas cartas. Sem mais outras considerações, o autor é um judeu de cultura helenística, esperto na arte oratória, atento à interpretação pontual das passagens veterotestamentárias que utiliza, frequentemente segundo a versão dos LXX, para apoiar seus argumentos). Mas se, dar a Deus, neste ministério inferior, uma glória acidental é um ato sacerdotal, não há no estado do Filho, que é para o Pai a sua própria glória essencial, e ato incessante e infinito de amor que responde a este ato, uma espécie de sacerdócio sublime, tipo e exemplar eterno de todo o sacerdócio e de toda a religião? Vários padres assim o pensaram (P. Giraud,o.c.).
São Cirilo de Jerusalém (315 – 386), na sua décima catequese, diz: Cristo é Sumo Sacerdote; Ele possui um sacerdócio imutável, que não começou com o tempo. Ele não o recebeu de uma sucessão que se dê segundo a carne; Ele não foi ungido com um óleo figurativo, mas foi-o pelo Pai mesmo, antes dos séculos.
Repitamos ainda, todavia, que não se trata, no Verbo, de um sacerdócio propriamente dito, o que implicaria uma inferioridade real: “Christus non fuit sacerdos secundum quod Deus” (STh III, q. 22,a.3). Mas nós podemos, com os Padres, ver na glorificação do Pai pelo Filho como que um tipo eminente de sacerdócio.