UM GRITO PELA AMAZÔNIA X UM OLHAR PARA O AMAZÔNICO.
A “Amazônia é terra disputada em várias frentes…” são palavras do Papa Francisco dirigidas à mais de 3500 indígenas no Peru, por ocasião do lançamento do Sínodo para Amazônia, onde denuncia a ganância dos mercadores de sempre. Não seria difícil compreender sem muito esforço, que há 518 anos atrás, quando aqui chegaram os conquistadores, vislumbraram a pujança e a grandeza destas terras brasileiras e tudo o que sucedeu depois. Porém, a Amazônia é a única região que resistiu por longos anos o vilipêndio dos conquistadores. Agora sentimos que sua ameaça é iminente. Nos últimos anos quase não se ouve mais o grito das populações que ainda resistem com seus costumes preservando a cultura e o amor pela exuberância de suas matas e os seus caudalosos rios. O neocolonialismo quer nos silenciar como sempre, e hoje com uma sofisticação maior, ainda nos oferecem os mesmos presentes.
Não queremos ser vistos apenas como o “Pulmão do Mundo”, pois não somos importantes simplesmente por preservar o que seja bom para o mundo. O que somos hoje, esplêndida e exuberante, qualquer parte deste planeta terra outrora também foi. O que há de se perguntar, é porque somos enquanto outros lugares deixaram de ser? Deus não fez a Amazônia melhor do que qualquer outra região do mundo. Desde o começo tudo esteve interligado! O Criador não nos fez também melhores do que nenhuma outra criatura da humanidade, apenas nossos pais nos ensinaram que a natureza nunca foi ou será nossa inimiga para que possamos destruí-la. Quem sempre soube, conviveu bem com a natureza, soube também cuidar dela. Se há 518 anos atrás fomos colonizados para espoliarem nossas riquezas minerais, ignorando de que aqui havia pessoas, nada mudou. Apenas a terra deu várias voltas em torno de si mesma para chegar onde estamos. Apesar de tantos anos, para muitos ainda não somos nada, apenas temos tudo que lhes interessa. Não somos apenas parte de uma ecologia, com ela somos! Aqui nossas casas não têm chaves, até os animais são bem-vindos, se eles tiram algum alimento de nossas mesas é porque estão com fome. Fiquem sabendo que eles levam somente o alimento, não destroem nossas casas muito menos nossas vidas. Ao longo desses séculos ambos conseguiram conviver muito bem. Deus não erra! No ciclo da vida todas as espécies precisam sobreviver! Quem sabe, um dia aprenderemos que tudo o que acontece hoje com a natureza, acontecerá de certo modo amanhã com as pessoas em proporção maior. Se cuidamos seremos cuidados, se destruímos assim também seremos destruídos.
O que nós queremos? Talvez, nada! Para muitos, não existimos. Se ao aqui chegarem, ao menos nos perguntassem sobre o que nós queremos, já seria um grande avanço. Infelizmente ao chegarem aqui trazem consigo todas as respostas, mesmo sem termos formulado sequer uma pergunta. Se interpelados fossemos, diríamos: porque temos que morrer para que vivam eles? Seria bom se todos vivêssemos. Para que cuidamos de nossa “Casa Comum” que eles dizem não ser nossa, prevalecendo somente o “eu” deles? Temos governantes, ou somos governados? Estes que escolhemos, para cuidar de nós, tornam-se espoliadores da vida de nossos filhos. Por que temos que agonizar hoje e morrer em nossos filhos amanhã?
A Amazônia clama por nós, nossos gritos não estão em nossas vozes, pois elas não existem para muitos! Se ao menos entenderem que somos o “Pulmão do mundo”, mesmo que isso para nós não seja suficiente. Que eles compreendam ao menos que o nosso existir não foi pensado por nós. Quem nos criou em sua benevolência, nos desejou. Se isso for respeitado já seria suficiente. Se isto não bastasse, clamamos por urgência através das sábias palavras do Papa Francisco: Para quem perdeu o sentido da dignidade da pessoa humana, nas mesas onde é gestada “a Globalização da Indiferença” muitos não são convidados. Resta-nos aguardar as migalhas que caírem das mesas de nossos mercadores. Eles não só reproduzem a história, tornam-se mais cruéis. Aqueles que não compreendem o valor das pessoas, estes atropelam as leis dos Direitos Humanos (10 de dezembro de 1948) que eles mesmos outorgaram.
Estamos assistindo, nos últimos tempos, a crise humanitária das migrações. Resta-nos perguntar: o que têm levado tantas pessoas seguirem por caminhos incertos, em busca de algo melhor em terras distantes? O mundo empobreceu-se nos últimos anos. Hoje são sessenta milhões de migrantes. “Os ratos vendo chegar as águas, precisam sair dos porões para as primeiras classes pensando numa sobrevida”. Esta história aconteceu com o Titanic (1912), foi para as telas dos cinemas em 1998. Conta o filme que o navio depois de uma longa viagem, à certa altura, se chocou com um iceberg e naufragou no oceano. A tripulação só percebeu o que estava acontecendo quando os ratos começaram a sair dos porões. Ainda assim, com o navio naufragando muitos não perceberam que as águas que entravam pelos porões chegariam, a qualquer momento, nos andares superiores. Nestas condições, o destino de todos seriam um só: o naufrágio de todos.
Assim caminha a humanidade. Se não nos prevenirmos antes de partir, por certo, os primeiros a serem tragados pelas águas são os que vivem nos porões da existência. Porém, todos naufragarão, de algum modo. Enquanto outros gritavam mediante a destruição iminente, alguns como inatingíveis, continuaram a festa. A orquestra não podia parar.
Hoje, ouvem nossos gritos “nos porões da Amazônia” e assim procedemos para o bem da humanidade. Quer queiramos ou não, estamos interligados. Todos as nossas ações em prol da Vida no Planeta, por menores que sejam, serão sempre atos coletivos. Comecemos hoje!
P. Ademir Vicente de Paula SCJ (Juruti Velho/PA – Brasil).